domingo, 8 de outubro de 2023
Entrevista: Manowar volta ao Brasil celebrando 40 anos e focando em novas conquistas
Foto: Jake Owens / Magic Circle Entertainment
Na estrada desde o ano passado com “Crushing the Enemies of Metal Anniversary Tour”, o Manowar faz uma parada única no Brasil, em São Paulo, para celebrar os seus quarenta anos de história no Espaço Unimed, em 23 de setembro.
Em entrevista concedida por e-mail, Joey DeMaio fala sobre a turnê sul-americana, mudanças recentes de formação, trabalhos novos, legado e futuro do Manowar.
Turnê de aniversário no Brasil e novos países da América do Sul
Prestes a desembarcar pela quinta vez no Brasil, o Manowar vem celebrando desde 2022, na estrada, seus quarenta anos de carreira. Não foram tantas as aparições desde 1996, quando estreou no país divulgando “Louder than Hell”: o grupo retornou em 1998, 2010 e 2015. Apesar disso, a relação com os fãs brasileiros é saudada por DeMaio, baixista, fundador e principal compositor da banda.
“O vínculo entre Manowar e Brasil é inabalável; a paixão que os Manowarriors brasileiros trazem é marcante! Cada vez que chegamos a esta terra incrível e amante do metal, acrescentamos novos contos épicos aos nossos livros de história.”
O toque especial da turnê sul-americana é a estreia do Manowar em alguns países do continente. O baixista comenta o sentimento de ainda ter lugares novos a explorar, mesmo após quatro décadas de estrada.
“Conquistamos muito desde que começamos e estamos orgulhosos disso. Mas ainda há muito por vir, tantos países para conquistar, tantas ‘primeiras’ para experimentar. Finalmente, chegar ao Equador, Colômbia, Peru e Bolívia pela primeira vez é incrível! Cada primeira vez em um novo país proporciona uma energia única que se acumulou em todos aqueles Manowarriors que estão esperando por nós, às vezes há décadas. É difícil colocar nossa empolgação em palavras.”
Como a atual turnê celebra a trajetória de quatro décadas do grupo em vez de promover um álbum específico, como em apresentações anteriores, Joey explica como foi o processo de seleção de músicas para o novo show.
“Sempre pensamos muito em nossos sets, para incluir algo para todos. Você precisa do equilíbrio certo entre músicas rápidas, cadenciadas e baladas. A ordem certa também é importante para construir o espetáculo; e, claro, todo mundo tem favoritos diferentes. A ideia é encontrar um equilíbrio – honrando o nosso legado e ao mesmo tempo avançando com as nossas criações mais recentes. A conexão com nossos fãs é lendária, e é justo que ofereçamos a eles tanto a nostalgia dos clássicos quanto a emoção das músicas mais recentes.”
Com uma base de seguidores dedicados, é natural que muitos deles queiram assistir o maior número possível de apresentações do Manowar. E, como uma discografia ampla, há margem para que os repertórios mudem para gratificar esses fãs. DeMaio fala sobre a possibilidade.
“Frequentemente variamos e ajustamos o setlist. Além disso, não existem dois shows iguais porque a energia do público e a interação entre banda e fãs é sempre única!”
Mudanças recentes e a formação atual
Ao longo de quase todo período em suas três primeiras décadas, o Manowar manteve sua formação mais ou menos estabilizada. As mudanças no guitarrista e baterista que acompanhavam Joey DeMaio e o vocalista Eric Adams eram pontuais e duradouras.
Nos últimos anos, a banda passou por uma variação maior de membros. Em 2017, após nova saída de Donnie Hamzik, então regresso baterista do disco de estreia “Battle Hymns” (1982), o grupo contou pela primeira vez com um integrante não-americano, o brasileiro Marcus Castellani — E. V. Martel, também brasileiro, assumiria as guitarras na banda em 2019.
Desde o ano passado, porém, a formação se estabilizou com dois compatriotas do baixista — Dave Chedrick empunhando as baquetas e Michael Angelo Batio assumindo as seis cordas. Para o baixista, porém, a nacionalidade dos seus membros nunca foi um problema, pelo contrário.
“O Manowar e o espírito do metal não conhecem fronteiras. Ao longo dos anos tivemos o prazer de colaborar com irmãos incrivelmente talentosos de diferentes cantos do mundo. Cada um trouxe seu próprio sabor, experiências e influências únicas para a banda. Trabalhamos com um guitarrista e baterista brasileiros e eles tiveram o fogo e a paixão dos Manowarriors brasileiros que mencionei antes. Foi um prazer tê-los conosco. E o mesmo vale para Anders Johansson, nosso irmão sueco. Ele é um baterista fantástico e um ser humano incrível!”
Joey ainda se mostra empolgado quanto ao entrosamento com os novos recrutados.
“No Manowar, não se trata apenas de música; trata-se do vínculo, da unidade, da fraternidade. Michael Angelo, com suas habilidades virtuosas na guitarra, e Dave, com sua bateria estrondosa, combinam perfeitamente musicalmente; mas, além do mais, eles são irmãos que compartilham a mentalidade de Eric e a minha! Nós quatro estamos nos divertindo muito e o público pode sentir isso!
Processo criativo para lançamentos no mundo de hoje
Em meio à turnê de celebração de 40 anos, o Manowar tem trabalhado em estúdio na composição de material novo com Michael Angelo Batio. O virtuoso guitarrista, ao lado do vocalista Jim Gillette, formou o Nitro nos anos 1980. O grupo desfrutou de certa repercussão pela técnica de Batio e o alcance vocal de Gillette.
Joey DeMaio explica como essa experiência tem se apresentado no processo criativo, que já resultou no single “Laut und hart, stark und schnell”, lançado neste ano.
“O fogo da criação está sempre queimando nos corredores do Manowar. E, sim, estamos trabalhando em material novo! Ter Michael conosco é como combinar dois titãs da mesma época. Ele começou na mesma época que nós, então há, sem dúvida, uma compreensão compartilhada da era dourada do metal, uma reverência tácita pelas raízes. No estúdio, essa história compartilhada faz com que o processo de composição flua com uma sincronicidade natural. É como se dois ferreiros da mesma forja martelassem uma lâmina nova.”
No início de carreira, foram seis anos entre a estreia e o sexto álbum “Kings of Metal” (1988). O ritmo de lançamentos do Manowar, que chegou a incluir dois discos no ano de 1984 (“Hail to England” e “Sign of the Hammer” em julho e outubro, respectivamente), reduziu-se a partir dos anos 1990, com cinco álbuns de inéditas em pouco mais de três décadas.
Para Joey, passar bastante tempo na estrada é um fator que influiu para essa redução.
“Estivemos em turnê e isso também significa que investimos muito tempo nos preparando meticulosamente para esses shows. Nós não cultivamos coisas. Então, quando uma turnê está chegando, nós trabalhamos nela frequentemente por um ano ou mais no conceito de iluminação, cenário, panos de fundo, etc. Eu poderia continuar indefinidamente.”
Apesar do baixo número de álbuns completos novos, o Manowar tem sido mais prolífico em lançamentos de curta duração no novo milênio — já foram cinco EPs e quatro singles. Num mundo cada vez mais dominado por streamings, DeMaio explica como enxerga a banda nesse novo cenário.
“O panorama da música realmente evoluiu, mas sempre foi assim. Vivemos numa era de gratificação instantânea, onde tantas atrações competem pela atenção dos consumidores que os ouvintes muitas vezes preferem pequenas porções de qualquer coisa (música incluída) em vez de mergulharem numa viagem mais longa. Dito isto, acredito que se você realmente ama alguma coisa, você não se cansa dela e então não se importa se uma música tem 5 ou 15 minutos de duração.”
Para o baixista, no entanto, a decisão com relação ao formato ou a duração da música é puramente artística.
“O Manowar sempre priorizou a qualidade em detrimento da quantidade. EP, single ou álbum completo; tudo o que fazemos é movido pelo espírito do verdadeiro metal e pelo nosso compromisso eterno com nossos Manowarriors. O Manowar nunca seguiu tendências ou modelos. Sempre foi sobre o que parece certo para a banda e para nossos fãs leais. Se uma história ou mensagem for melhor transmitida através de uma música de 3 minutos, esse é o caminho que seguiremos. Mas se uma história épica exige uma peça mais longa, então não faremos concessões apenas para nos adequarmos aos moldes dos hábitos modernos de streaming.”
Para reforçar seu argumento, o baixista citou como exemplo seu disco lançado em 1992 pela Atlantic Records, do grupo Warner Music. Tratava-se da primeira grande mudança de formação da carreira do Manowar, com a saída do guitarrista e co-fundador Ross the Boss, e do clássico baterista Scott Columbus (que retornaria no trabalho seguinte).
Como carta de apresentação dos respectivos substitutos David Shankle e Rhino (Kenny Earl Edwards), o álbum já começava com uma épica faixa repleta de solos sobre o protagonista da “Ilíada”, poema histórico de Homero narrando a Guerra de Tróia.
“Veja ‘The Triumph of Steel’. A gravadora surtou quando fizemos ‘Achilles, Agony and Ecstasy in Eight Parts’, com mais de 28 minutos de duração. Mas os fãs adoraram!”
A liberdade de formatos também tem a ver com a fundação da própria gravadora da banda, a Magic Circle Music, responsável pelos trabalhos do grupo desde o EP “The Sons of Odin” (2006). Joey fala sobre as diferenças.
“Ter nossa própria gravadora é como empunhar nossa própria espada. Não tem mais intermediário nos pressionando, pedindo que façamos as coisas desta ou daquela maneira porque alguma pesquisa de mercado sugere um determinado estilo. Não que tenhamos realmente seguido as exigências deles mesmo quando estávamos nas gravadoras, mas não ter que lidar com isso é muito libertador. Cada decisão, seja ela relacionada à nossa música, produtos ou turnês, é baseada em nossos valores e crenças.”
Celebrando o legado e adicionando capítulos à história
Como natural a uma banda tão longeva, o Manowar tem equilibrado o trabalho de turnês e o processo criativo com a celebração de seu legado.
Uma das formas de manter vivo o seu passado foi através de regravações (“Battle Hymns MMXI”, de 2010, e “Kings of Metal MMXIV”, de 2014) e remixagens de sua discografia clássica (as “Imperial Editions” de “Into Glory Ride” e “Hail to England” lançadas em 2019). Joey DeMaio explica essa abordagem.
“Estamos orgulhosos de cada álbum que lançamos. Cada um deles é o melhor que poderíamos fazer naquele momento. Mas a tecnologia progrediu significativamente e, claro, nós também evoluímos e essas músicas também. Ao regravar, você pode inserir todos aqueles pequenos ajustes que usou ao tocar essas músicas queridas ao vivo tantas vezes. Estamos dando aos fãs a oportunidade de descobrir os primeiros álbuns de uma nova maneira. Eles adoraram e pediram que outros álbuns fossem remixados ou regravados. É muito possível que façamos isso novamente no momento certo.”
Outra forma encontrada para celebrar o seu legado foi a partir de um livro de fotos, “The Blood of the Kings – Vol. 1”, lançado em 2019. O acervo, como era de se esperar, é enorme. DeMaio explica como ele foi construído.
“Nosso irmão, o falecido John ‘Dawk’ Stillwell, foi um dos principais contribuidores do nosso arquivo. Além de ser nosso comandante-chefe de todas as nossas armas (ou em outras palavras, responsável por nossos incríveis equipamentos personalizados) e o melhor amigo que você poderia esperar, ele documentava nossos shows (dentro e atrás do palco) sempre que podia. Com o tempo, adicionamos fotos e vídeos feitos por muitas outras pessoas talentosas aos nossos cofres.”
O baixista também explicou o motivo da delimitação temporal do primeiro trabalho (até 1988), bem como foi feita a escolha do material incluído no livro, que deve ter sequência.
“Foi uma experiência cheia de nostalgia e orgulho. Os anos 80 foram uma era decisiva para nós e para o metal em geral. Selecionar as fotos não foi tarefa fácil. Nossos arquivos são vastos e cada foto traz uma memória, uma história para contar. Queríamos que o livro homenageasse a época, nossos fãs e cada momento que nos tornou quem somos hoje. Continuaremos contando a história do Manowar assim que tivermos tempo entre a turnê e o estúdio. Como eu disse, os arquivos são vastos, então leva tempo para examinar todo esse material. Mas vai ser muito divertido!”
Para contar uma história cheia de acontecimentos icônicos e famoso por seus inflamados discursos durante os shows, Joey DeMaio fez em 2019 uma “spoken tour” para divulgar o lançamento do livro de fotos. O baixista não descarta dar também sua versão por escrito sobre toda a trajetória do Manowar.
“Muitas vezes nos pediram para contar nossa história. O ‘quando’ e o ‘como’ serão melhor determinados depois que tivermos a oportunidade de passar novamente pelos cofres. Não temos pressa: ainda estamos adicionando novas experiências para muitos outros capítulos do livro do Manowar!”
O músico explica um pouco mais sobre essas novas experiências.
“Há tantas coisas que mal podemos esperar para fazer! Queremos tocar na América do Sul com mais frequência, adicionar mais shows em todos os países. Queremos expandir a nossa comunidade de Manowarriors em todo o mundo; trazer não apenas o verdadeiro metal para nossos fãs, mas inspirá-los a ter fé em suas habilidades, defender suas crenças e almejar as estrelas! Nós conseguimos, e eles também podem!”
Como Joey faz questão de lembrar, o Manowar não é uma banda que apenas celebra seu legado. Dessa forma, há muita coisa nova por vir.
“Não vivemos no passado nem no futuro. Nós nos concentramos no agora. E neste momento, há tantas coisas interessantes acontecendo: estamos tocando para fãs em países que nos esperam há muito tempo, estamos trabalhando em novas músicas que vão deixar você sem fôlego, e em algumas outras surpresas para nossos fãs. Basta nos seguir nas redes sociais e no YouTube para ficar ligado!”
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