segunda-feira, 17 de abril de 2017

O underground curitibano e suas panelas



Por: Willian Jhonnes

Salve galera! Essa é nossa nova coluna, a Universo Underground, e nela falaremos sobre a cena underground local, nacional e mundial. Nosso objetivo é discutir as questões que envolvem o universo underground – bandas, shows, bares, movimentos, etc. – e estaremos por aqui quinzenalmente. E, para nossa estreia, falaremos sobre a cena curitibana.

Há anos – pelo menos 20, pelas minhas contas – se discute a cena underground em Curitiba. Independente do estilo musical (metal, punk, hardcore), uma constatação é unânime: a cena é uma grande cozinha, cheia de panelas. Aqui, ao que parece, se você não for amigo de alguém, se você não puxar o saco de fulano ou ciclano ou, principalmente, se os donos de alguns bares não forem com a sua cara, você não tem espaço. Independente do fato de você ser um músico, produtor ou jornalista competente, se você não fizer parte de uma das panelinhas, não vai conseguir nada. Já experimentei essa sensação, tanto como músico como produtor, ao perceber que não podia tocar ou produzir shows em bares rivais (e isso há quase 20 anos atrás), pois os donos não admitiam que uma banda que se apresentasse em um fosse se apresentar em outro. Bandas que tocavam no bar A, por exemplo, eram proibidas pelo proprietário desse bar de tocarem no bar B ou C se ele não fosse amiguinho dos outros donos – e não eram bares pequenos. Casas como o Ópera 1 e Arcadas do Rock, lá pelos idos de 1993 a 1995, não conseguiram sobreviver a essa política, já que as principais bandas da cidade não podiam se apresentar lá, e isso enfraqueceu as casas a ponto de que elas não tivessem bandas nem público, culminando com sua extinção.
Os Bares

Hoje, a coisa não parece estar muito diferente. Mas, para piorar, as grandes casas não apoiam o pessoal do movimento underground. Os bares com maior público em Curitiba estão limitados – e nos limitando – a apresentações de bandas tributo (que, na minha opinião, é uma denominação pedante para uma banda cover), deixando pouco espaço para o pessoal que faz música autoral. Para isso, os palcos do 92 Graus, Lino’s Bar e Lado B acabam se tornando as únicas opções.

Se você imaginar que Curitiba, proporcionalmente, é a campeã brasileira em número de músicos, a oferta de palcos deve ser igualmente generosa. E é. Temos casas com mais de 20 ou 30 anos, e novas surgem todo ano, o que deveria facilitar o acesso das bandas ao público, mas não é isso que acontece. Diariamente, novas bandas surgem e, infelizmente, inúmeras acabam por conta da falta de incentivo dos bares. Bandas boas, com boas propostas, mas que não conseguem sobreviver fazendo música autoral. É algo inimaginável, mas isso nos leva a outro problema.
Os Produtores

Assim como acontece com as bandas, novos produtores de eventos surgem todos os dias. Aqui ou ali surgem novas produtoras, dispostas a organizar shows em um bar ou outro, e essa deveria ser uma boa notícia, mas não é. Essas produtoras, em sua maioria, são ligadas, direta ou indiretamente, aos donos dos bares. Outro fato importante é que as pessoas envolvidas geralmente são músicos, com suas bandas e amigos (e as bandas dos amigos), e isso faz com que apenas essas bandas sejam convidadas para os eventos organizados. Alguém aí vai perguntar “mas o que há de errado nisso?” e eu respondo: serão sempre as mesmas bandas, nos mesmos palcos, para um mesmo público, o qual acaba se esvaziando.

Para as novas bandas que surgem no circuito underground curitibano só restam 2 opções: ou se “aliam” a esses produtores, se integrando ao seu grupo “seleto” de amizades, ou morrem de inanição, pois não serão convidadas para eventos nem terão espaço nos grandes bares da cidade. Essa, no meu ponto de vista, é a pior situação para uma banda, pois obriga os músicos a contrariarem seus princípios, seja pela questão das alianças ou o fato de que a banda se obrigará a tocar covers para sobreviver. Se você pensar em uma capital, onde esse tipo de situação seria desnecessário, engana-se. Mesmo tendo público para consumir toda a música autoral produzida por aqui, os produtores insistem em organizar os eventos apenas entre suas panelinhas, e isso inclui os produtores que têm espaço em rádios ou na internet. E, claro, é ridículo ver as guerrinhas de ego entre eles, com infinitas alfinetadas pelas redes sociais, polarizando sua briguinha infantil, dividindo ainda mais a cena.
As Bandas

Um dos traços mais marcantes dessa divisão que temos na cena underground curitibana são as bandas. Assim como os produtores e os bares, as bandas também se cercam, apenas, daqueles que são seus amigos. A coisa mais comum nos shows de bandas underground são músicos de bandas “concorrentes” assistindo ao show de uma banda apenas para crticá-la, como um bom aluno da 5ª série. É fácil identificá-los, já que estes músicos são vistos, geralmente, de braços cruzados e alguns, como prova máxima desse panelismo, de costas para o palco. Esta atitude adolescente por parte dos músicos prova que o ego deles é extremamente inflado e realmente muito frágil. Ao ir ao show de uma banda “rival”, o músico curitibano mostra toda a sua maturidade ao desrespeitar o coleguinha em cima do palco, tentando desmerecer todo o trabalho que ele tenha feito e todo o caminho que ele percorreu até ali. Seja porque as bandas sejam de estilos diferentes (sim, eles são infantis ao ponto de desmerecer uma banda que não toca o mesmo estilo que eles) ou por pura antipatia gratuita, eles agem como se quisessem anular o trabalho dos outros, acreditando que, com isso, o seu se sobressairá. O mais espantoso de tudo isso é que temos bandas com mais de 20 anos de atividade agindo exatamente desta forma.

Outra característica do músico curitibano panelista é a sua arrogância. Ele acredita que, pelo fato de ter uma banda que nunca saiu da cidade (não falo de ter tocado em outras cidades, mas que seu nome não é sequer lembrado fora daqui), ele é a estrela mais brilhante da grande constelação mundial. Ele, no alto da sua estrelisse, nega o acesso de jornalistas, se recusa a conceder uma simples entrevista, ignora tentativas de contato e, claro, reclama da falta de apoio por parte da imprensa. Para a grande estrela curitibana, os veículos que interessam são apenas os que tenham certo renome, seja local ou nacional, caso contrário, outros veículos não são dignos da sua benevolência. É comum ver um desses músicos reclamar que não tem espaço para divulgar sua banda, seus shows, seus lançamentos, mas, quando solicitados, nem mesmo se dão ao trabalho de responder. Uma atitude ridícula, claro, mas nada se compara ao pior de todos os fatores dessa cena.
O Público

Nada como um público engajado para fazer a cena underground forte e movimentada, certo? Pena que isso não exista aqui. Nos shows underground curitibanos, apesar da grande variedade e competência dos músicos e bandas, é praticamente impossível fazer com que mais de 30 pessoas compareçam. Em um exemplo muito próximo, no show das bandas Death Chaos, Divide e Woslom no 92 Graus (leia mais sobre esse show aqui), o público não chegou a 50 pessoas. Eram três excelentes bandas – uma curitibana, uma alemã e outra paulista -, o ingresso custava R$ 10,00 e, mesmo assim, naquela noite, um bar famoso por apresentar as tais bandas “tributo” tinha fila na porta, mesmo com ingressos (e cervejas) mais caros e, claro, shows infinitamente inferiores. Curitiba, a cidade internacionalmente conhecida pelos “paga-pau” de gringos, tem, com certeza, um dos públicos mais burros da Terra. Mesmo com bandas autorais excelentes no quintal de casa, prefere ver bandas covers tocando muito mal, em porões lotados e sem ventilação, a apoiar quem realmente faz música por aqui. Mas se são “paga-paus” de gringos, isso é normal, né? Então, se colocarmos uma banda paulista, carioca (tá, eles não são gringos, mas são de fora) ou, pior, uma banda alemã, sueca ou de qualquer outro país, você acha que o lugar lota? NEM A PAU! O curitibano não sabe prestigiar e apoiar a música autoral, nem mesmo quando ela vem de fora.

Essa falta de apoio, como sempre, esvazia os eventos underground da cidade, pois as bandas envolvidas não se sentem motivadas a continuar a tocar para quem não os respeita (se não respeitam uma banda que viajou 19 horas de avião, mais 6 horas de van, fica difícil acreditar que respeitem qualquer outra coisa). Muitas manifestam o desejo de deixar o circuito underground de Curitiba e tocar apenas em cidades do interior, pois lá o público comparece aos shows, recebe as bandas de forma calorosa e, acima de tudo, demonstra respeito pelo trabalho delas. Acho que temos um problema sério a ser resolvido, mas a solução parece estar tão distante que nem sequer tentamos. Aí vemos um outro traço do panelismo: o público só vai (e quando vai) aos shows dos amigos, dos brothers, dos “camaradas” mas, mesmo assim, ainda é capaz de abandonar esses amigos por uma banda cover qualquer.
Pra terminar…

Nessa panelaria toda – bares, produtores, bandas e público -, quem perde somos nós. Não temos acesso aos eventos, às bandas, aos bares e, por consequência, deixamos de fazer nosso trabalho. Cobrimos shows para oito pessoas, sendo que apenas duas haviam pago o ingresso. Tivemos nosso credenciamento negado em vários shows e tivemos que arcar com o custo dos ingressos para podermos fazer nosso trabalho. Tivemos tentativas de contato ignoradas por conta de produtores e músicos locais, a medida que produtoras, assessorias e músicos estrangeiros nos tratam com o maior respeito. Raramente temos nosso trabalho reconhecido, mesmo quando nos propomos a fazê-lo de maneira isenta e sem “recompensas”. Não nos integramos a esses grupinhos, como se fazia na escola e, por isso, temos nosso espaço, nossa visibilidade e nosso reconhecimento realmente reduzidos, como se nosso trabalho não merecesse respeito simplesmente porque não puxamos o saco de ninguém.

E, claro, para que eu não pareça um velho reclamão, fico com a conclusão que tirei em uma conversa com alguns músicos curitibanos depois de um show: nós reclamamos tanto das panelinhas que vamos formar a panelinha daqueles que reclamam das panelinhas.

Até a próxima.
Esse E um artigo escrito pelo Jornalista Willian Jhonnes do ARTEMISROCK NEWS site dedicado ao rock metal e suas vertentes todas as opinioes são expressamente voltado ao autor do texto .............http://artemisrocknews.com/br/colunas/universo_underground/2017/04/universo-underground-estreia/

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