No final do ano passado, os quatro membros da banda polonesa de death metal Decapitated foram presos durante sua turnê pelos Estados Unidos por uma acusação de estupro e sequestro. O ocorrido teria sido no show que fizeram com Thy Art is Murder na cidade de Spokane, em Washington, no dia 31 de agosto. A vítima afirmou que ela e uma amiga foram convidadas para irem ao ônibus da turnê para tomar umas bebidas com os caras e quando chegaram lá o baterista Michal Lysejko começou a passar a mão nos seus peitos. Isso a deixou desconfortável e a partir daí, segundo a moça, o clima mudou e eles começaram a falar em polonês. A sua história termina com um estupro coletivo, dentro do banheiro, pelos quatro integrantes. No início de janeiro, os promotores do condado de Spokane retiraram as acusações prezando o “bem-estar da vítima” e o “interesse da justiça”, é o que diz o jornal local The Spokesman-Review. O veículo de comunicação também afirma que apesar de terem sido retiradas, eles podem vir a ser processados novamente por esse mesmo caso.
Considerando todas as situações, falar sobre qualquer coisa que envolva estupro é sempre um caso bem delicado. Qualquer história contada tem várias versões, mas quando envolve um crime tão grave quanto esse, é possível multiplicar por mil. Cada um dos envolvidos tem o seu lado. E a verdade aqui fica comprometida, especialmente quando se trata da versão da vítima. Ela se torna vítima e algoz instantaneamente e, com certeza, é preciso muita coragem para levantar a cabeça e contar o que aconteceu. A melhor descrição que eu já vi sobre o assunto foi o conto de um escritor paranaense, Dalton Trevisan, que a história de um delegado que investiga um estupro e é possível ouvir as versões por todos os vieses, da vítima, dos acusados e das testemunhas. Em cada uma delas a situação muda completamente. Agora trazemos a cena para os dias de hoje, que parece ser mais aberto a uma real investigação de estupro. Ampliamos o acontecido em uma cidade pequena dos Estados Unidos, Spokane incluindo uma turnê de uma banda de metal, Decapited. Fica ainda mais complicado.
É fácil olhar de fora e discutir o que houve. Metade diz que foi e a outra diz que não. Existe uma situação que infelizmente é tão vista como comum e banalizada que faz com que continue acontecendo e com que muitas vítimas não denunciem. E isso é o pior ciclo que pode acontecer. Sou mulher, então, vou olhar para isso com tudo o que o fato de ser mulher me trouxe. A primeira coisa que acontece com a mulher que denuncia ser vítima de um estupro é ser desacreditada. A moral dela é posta em dúvida e qualquer deslize anterior já a faz ser vista como mentirosa. Automaticamente. Mas ela estava lá porque quis. Mas ela entrou no ônibus. Mas ela bebeu cerveja com os caras. O grande problema com essas acusações é que existe um belo limite aqui. Ela podia até ter ficado afim de um deles, e ter entrado no ônibus com a esperança de que algo acontecesse.
Só que estupro e sexo são duas coisas muito diferentes.
Nesse caso específico, a menina já havia mentido para a polícia sobre um caso, o que obviamente desacreditou a vítima. Outra questão vista como motivo para liberação da acusação foi o fato de que a moça estava no mosh e se jogou diversas vezes na grade durante o show e que isso seria a causa para os seus ferimentos no braço. No meu modo leiga de medicina forense, mas com conhecimentos advindos do CSI, imagino que se jogar contra a grade ou no mosh, e ter os braços segurados contra a pia do banheiro sejam machucados muito diferentes, e ainda assim difíceis de serem provados. Assim como há muitos casos de mulheres que mentem para a polícia com medo de apanharem novamente dos namorados ou maridos.
Como disse anteriormente, é um assunto muito delicado não sabemos se o estupro aconteceu, e ser liberado por falta de provas não quer dizer que se é inocente. A pior parte de tudo isso é a banalização em relação a um crime tão absurdo. Há muitas lacunas soltas nessa história, e que provavelmente jamais serão preenchidas. E o problema é justamente esse, muitas vezes somente a vítima e o criminoso sabem o que aconteceu e a justiça fica de fora nesses casos. Parece sem solução, não é? Então cabe a nós, como uma sociedade que preza sua própria liberdade sexual, que briga pelos direitos e aceitação de que fazemos o que queremos e com quem queremos, a repensar os conceitos sobre esse tipo de violência. Porque, sim, com provas ou sem provas, estupro é crime.