terça-feira, 12 de junho de 2018
Confissões de um Herege
Vou ser bem mais enfático: IM-PA-CI-ÊN-CI-A!
A minha explícita demonstração de aborrecimento não tem relação com o conteúdo da obra ou com a pessoa do artista retratado. Ela é direcionada para a forma como o produto é apresentado, a qualidade do livro que chega às suas mãos.
Já tive oportunidade de resenhar outras obras lançadas pela editora EV7 e sempre aponto a satisfação por disponibilizarem material de artistas que fogem do lugar comum que as grandes editoras estão colocando nas prateleiras, além da excelente qualidade de impressão, papel, capa… Mas também sempre chamei atenção por pecarem no que deveria ser o principal em se tratando de um livro: a parte textual. A tradução e/ou revisão são sofríveis, contendo falhas grosseiras de concordância, frases que surgem sem sentido, grafias errôneas… Deixo bem claro que, em relação aos livros anteriores publicados, houve uma melhora nesse sentido, mas o que nós, leitores, desejamos, é o índice zero de erros.
Que fique bem claro que essa não é uma meta inatingível. Posso falar isso claramente, pois leio um monte de livros e revistas durante o ano e sei que eles não tem erros, então não se trata de algum tipo de preciosismo absurdo, mas do desejo que esse aspecto tão essencial seja cada vez mais bem tratado, pois o texto precariamente apresentado macula toda a apresentação do tomo.
E convenhamos que o músico aqui em foco merece essa diligência. Adam Darski, mais conhecido como Nergal, o líder da banda polonesa Behemoth, revela-se uma pessoa de raciocínio afiado, que expõe os seus pontos de vista de forma embasada e coerente. O Behemoth é, hoje, uma das bandas mais relevantes do cenário da música pesada e a inteligência de seu mentor demonstra os fundamentos sob os quais seu sucesso está sendo erguido.
O formato do livro não segue os padrões de biografia. Trata-se de uma série de entrevistas realizadas pelos autores e que foram compiladas, em capítulos temáticos, onde o entrevistado discorre sobre os mais diversos assuntos: família, infância, religião, Polônia, carreira, sexo e a luta contra a leucemia, entre diversos outros tópicos. Os autores tomaram o cuidado de inserir perguntas objetivas – às vezes com um ou outro tom mais provocativo – de forma que suas intervenções não interferissem na espontaneidade das respostas de Nergal. Este, por sua vez, demonstra fluidez e inteligência em suas colocações, com a calma de quem possui convicção sobre sua filosofia de vida e o profundo respeito por qualquer um que não coadune com sua forma de pensar.
Como a voz principal da narrativa é de Nergal, não há nenhum teor sensacionalista sobre o seu período de enfermidade, como talvez obras de menor qualidade poderiam ter explorado, mas existem curiosidades que uma parte de seus fãs talvez desconheça, como o período em que se relacionou com uma estrela da música Pop da Polônia e foi, por conta disso, objeto de caça dos papparazzis, ou também sobre a sua participação como jurado na versão do programa “The Voice” daquele país. Nergal tem a consciência dos eventuais reflexos que essas inserções para fora do universo da música extrema possam ter gerado e relata sobre posicionamentos discordantes dentro de sua própria banda, mas a natureza de sua personalidade, tão bem apresentada pelo livro, é a de quem não segue dogmas. Nem religiosos, nem sociais e nem os do Heavy Metal.
Ao final das 277 páginas, você lamentará por não haver mais conversas. Poderia prosseguir por mais tempo e esse efeito ocorre pelo fato de que não há uma conclusão. O personagem se abre para o leitor e fica bem claro que ele permanece em construção. O Behemoth está no auge de sua popularidade ou o futuro ainda tem surpresas guardadas para uma banda tão extrema? Não sabemos ainda, mas seria ótimo se, daqui uns dez anos, pudéssemos ter uma nova rodada de conversas para saber o que mudou na visão de mundo desse questionador
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